Clássicos

VIAGENS NA MINHA TERRA, ALMEIDA GARRET


Almeida Garret é considerado o introdutor do Romantismo em Portugal, no ano de 1825. O livro “Viagens na minha terra” é de difícil classificação, sendo um híbrido de jornalismo, literatura de viagens, diário íntimo e prosa de ficção. Foi publicado em 1846 e traz várias reflexões literárias e filosóficas.
O livro possui 49 capítulos com relatos de uma viagem (realmente feita pelo autor em 1843, entre Lisboa e Santarém, a convite de um político – Passos Manuel) e as várias reflexões que ela traz à mente do viajante, desde amor a política.
Já em Santarém, começa a história amorosa de Joaninha dos olhos verdes (a menina dos rouxinóis) e o primo Carlos, a parte propriamente romântica do texto. Carlos é compromissado com Georgina, na Inglaterra, o que se torna um impasse para o romance, e faz parte do grupo de D. Pedro I.
A avó de Joaninha, D. Francisca, e o Frei Dinis sabem um segredo sobre Carlos. Ferido, ele fica alojado próximo à casa de Joaninha, e os dois se encontram em segredo. Curado, ele pressiona a avó a contar-lhe o segredo: Frei Dinis é seu pai e havia matado o marido de sua mãe, a qual morrera de desgosto.
Carlos abandona tudo, inclusive Joaninha, e volta para Georgina. Mais tarde, se acomoda, tornando-se um Barão, e abandona também Georgina. Em um fim trágico, Joaninha enlouquece e morre.
Os personagens são representações metafóricas de Portugal e do povo português:
Ø    Frei Dinis – representa o absolutismo;
Ø    Carlos – o espírito renovador e liberal;
Ø    Joaninha e Georgina – ideal moral da sociedade;
Ø    D. Francisca – a própria imagem de Portugal, prudência.
O livro faz uma análise da situação política e social de Portugal, em um tom, muitas vezes, de crítica.
A linguagem é natural e espontânea, em um diálogo com o leitor, no mesmo estilo adotado, mais tarde, por nosso Machado de Assis. Há trechos de metalinguagem (explicações sobre a própria escrita), muita intertextualidade (Homero, Camões, entre outros) e a METALEPSE, o encontro do autor (personagem real) com seus personagens fictícios no final.
Ao compor a heroína com olhos verdes, ele a aproxima do ideal clássico de mulher e, neste momento, faz várias reflexões românticas, embora não se considere romântico.
O texto é narrado em 1ª pessoa pelo próprio Garret. O clímax da história é o momento da descoberta do segredo por Carlos, que encaminha o enredo para o seu desfecho.
O contexto histórico é a Guerra Civil Portuguesa entre Constitucionalistas (D. Pedro I) e absolutistas (D. Miguel  I).
Não é uma obra de fácil leitura, devido, principalmente, ao vocabulário de época, bastante rebuscado, porém as analogias e reflexões do autor são bastante enriquecedoras.

Prof.ª Luciana





A CIDADE E AS SERRAS 

 EÇA DE QUEIRÓS (1845 – 1900)


A obra de Eça de Queirós é dividida em três fases: a primeira, experimental, é composta por artigos de folhetim; a segunda, realista,  contém livros como “O crime do Pe. Amaro” e “O primo Basílio”, trazendo cenas da vida portuguesa; a terceira, pós-realista, representa um período de maior maturidade artística, onde se encaixa o livro “A cidade e as serras”.
Essa 3ª fase é marcada pela desilusão e pelo abandono das ideias realistas, defendendo uma política colonialista, o nacionalismo e a vida pura no campo. O livro, publicado em 1901, um ano após sua morte, é considerado uma reconciliação de Eça de Queirós com seu país.
A história se passa no final do século XIX, em Paris (no início do livro – a cidade) e Tormes (as serras, em Portugal). Os personagens principais são Jacinto, José Fernandes, o Grilo e Joaninha. O texto é narrado em 1ª pessoa por José Fernandes, amigo e hóspede de Jacinto em seu casarão de Paris.
Na 1ª parte, há influências do Positivismo, de Augusto Comte: o conhecimento verdadeiro é somente aquele oriundo das ciências.
O enredo começa no ano de 1831, quando D. Galvão (avô de Jacinto) se muda para Paris. Seu filho, Cintinho, casa-se com a filha de um desembargador e morre três meses antes de nascer Jacinto (o protagonista). Jacinto, adulto, é apelidado de “Príncipe da Grã-ventura” por Zé Fernandes, e é um entusiasta das ideias positivistas. No casarão, há todo tipo de inovação tecnológica do final do século XIX. Segundo Jacinto, a fórmula da felicidade (bem viver) é: suma ciência x suma potência = suma felicidade. Ou seja, só se é feliz, tendo todo tipo de conhecimento, conforto, bens materiais.
Um imprevisto em Tormes (uma tormenta derruba a igreja onde estavam enterrados os ossos de seus avós) leva nossos protagonistas às serras. Na viagem, a bagagem de Jacinto é extraviada. Ele precisa permanecer em Tormes sem seus recursos de extremo conforto.
Contrariando as expectativas de Zé Fernandes (e as do leitor, talvez), Jacinto se acostuma à vida no campo, porém promove diversas melhorias em Tormes, conciliando, digamos assim, a cidade e o campo. Casa-se depois com Joaninha, prima de Zé Fernandes, com a qual vem a ter filhos.
No final, Zé Fernandes, retornando a Paris, também se decepciona com a vida na cidade grande e resolve retornar a Tormes, o verdadeiro castelo da grã-ventura.
Pode-se dizer que a reconstrução do túmulo dos ancestrais de Jacinto representa uma religação do protagonista com suas origens. Jacinto aprende a conciliar o melhor dos dois mundos (cidade/campo) e a tirar proveito dos dois.
Há várias características neo-árcades no texto, como o “fugere urbem” (fuga da cidade) e o “locus amoenus” (lugar aprazível, agradável). No final, uma nova fórmula da felicidade: áurea mediocridade bucólica = suma felicidade. Ou seja, aproveitar, porém sem apego, os bens materiais, “curtindo” a agradável vida campestre.
Obra muito interessante, em meu ponto de vista, e gostosa de se ler, leva-nos a refletir sobre o real valor de muitas coisas.





MEMÓRIAS PÓSTUMAS DE BRÁS CUBAS
MACHADO DE ASSIS – 1881

Primeiro livro realista brasileiro e o primeiro realista de Machado de Assis, escrito em 1881, “Memórias póstumas de Brás Cubas” é um romance com muitas diferenças das características próprias do Realismo, aproximando-o, para alguns, do Impressionismo, cujo interesse ultrapassa o que realmente teria acontecido e recai sobre a “impressão” que os fatos transmitem.
O narrador-personagem, Brás Cubas, começa sua história definindo-se como um defunto-autor, o que lhe permite narrar os fatos da forma como lhe convier e, ao mesmo tempo, sem se preocupar com opiniões e julgamentos alheios.
Após narrar as circunstâncias de sua morte, Brás Cubas fala de sua infância, repleta de mimos e satisfação dos desejos.
Em sua juventude, envolve-se com Marcela, uma prostituta que o “ama” enquanto duram seus mimos e presentes, e o pai, com medo de que Brás acabe com o dinheiro e a reputação da família, manda-o estudar na Europa.
Ao voltar e depois da morte da mãe, o pai quer estabelecê-lo na Corte, procurando-lhe um bom casamento e um cargo político. A princípio, Brás se envolve com Eugênia, porém, como a moça era manca, ele não a considera “digna” do cargo a que ele aspira, ou seja, não seria interessante para suas aspirações políticas casar-se com uma “coxa”.
Essa valorização da opinião pública norteia todo o romance, permitindo a análise aguçada da sociedade brasileira do final do século XIX: o egoísmo, a mesquinhez, a hipocrisia de muitos, principalmente da burguesia. É uma perfeita análise psicológica das pessoas à sua volta.
Brás conhece sua possível noiva, Virgília, filha de um Conselheiro, porém ela acaba o trocando por Lobo Neves, mais promissor politicamente. Depois de casada, no entanto, torna-se amante de Brás. É onde entra na história a personagem D. Plácida, antiga empregada de Virgília, a quem Brás arruma uma casinha, apenas para poder manter encontros secretos com Virgília.
Virgília chega a engravidar, supostamente de Brás, porém perde o filho. Mais tarde o marido é nomeado presidente de uma província no norte, e ela o acompanha, separando-se definitivamente de Brás.
Solitário, Brás dedica seu tempo à criação de um emplasto que cure todas as doenças e que, levando seu nome, possa torná-lo famoso e imortalizar sua memória, porém acaba adoecendo e morre, sem concretizar seu projeto.
Seu último capítulo é um resumo de todos os seus fracassos em vida.
Nesse romance, surge também a personagem Quincas Borba, que será retomada dez anos depois em um romance próprio.
O estilo de Machado de Assis é único e grandioso, ele dialoga com o leitor, expõe um realismo psicológico, com capítulos curtos, repletos de digressões e um humor sutil, às vezes pessimista, desnuda a vida social, mostrando que ela não passa de um teatro, onde a aparência parece importar mais que a essência do ser. Há também muitos momentos de METALINGUAGEM, com reflexões sobre o próprio ato de escrever.
Sei que sou suspeita para falar, como professora de Literatura, porém “Memórias póstumas de Brás Cubas” é um clássico que vale a pena ser lido e apreciado, independente de qualquer cobrança para vestibular.


Prof.ª Luciana






Um comentário:

  1. Capitães da Areia, do Jorge Amado seria minha sugestão de próximo clássico professora. Muito obrigado pela ajuda, nessa época está difícil conseguir ler qualquer coisa, nunca sobra tempo.

    ResponderExcluir